58 anos de Lago Paranoá
|
Pontão do Lago Sul - Foto: Divulgação |
Naquela
manhã de sábado, 12 de setembro de 1959, o aniversariante Juscelino
Kubitscheck, ao lado da esposa Sarah, manobrando um trator, e observado por uma
multidão de candangos fez descer as comportas da barragem do Lago Paranoá,
nascia, assim, um dos principais cartões postais da cidade, que com suas águas
abraça e encanta Brasília.
JK
completava 57 anos, no mesmo dia em que “renascia” o Lago Paranoá, uma vez que,
segundo relato do botânico e engenheiro francês Auguste Glaziou, integrante da
2ª Missão Cruls, liderada pelo astrônomo belga Luís Cruls e realizada no
período de julho de 1894 a dezembro de 1895, no mesmo leito teria existido um
outro lago no passado.
|
Barragem do Lago Paranoá 1959/1960 - Foto: Arquivo Público do DF |
“Entre
os dois chapadões, conhecidos na localidade pelos nomes de Gama e Paranoá,
existe imensa planície em parte sujeita a ser coberta pelas águas da estação
chuvosa; outrora era um lago devido à junção de diferentes cursos de água
formando o rio Parnauá...” Em seu relatório Glaziou conclui, que com o
fechamento dessa brecha forçosamente a água tornará ao seu lugar primitivo e
formará um lago artificial inteiramente navegável.
Esses
estudos foram realizados durante o período de atuação da Comissão Exploradora
do Planalto Central (1892 a 1896), cumprindo determinação da Constituição
Republicana de 1891 que previa a mudança da capital federal para o Planalto
Central, com a destinação de uma área de 14.400 Km², incorporando áreas das
antigas fazendas e vilarejos do estado do Goiás.
|
Observatório astronômico da Comissão Exploradora do Planalto Central. Foto: brazilia.jor.br- Divulgação |
Em
1948, 55 anos depois, a Comissão de Estudos para a Localização da Nova Capital
do Brasil, presidida pelo General Poli Coelho referendou os estudos da Comissão
Cruls, mas foi somente na Comissão de Localização da Nova Capital, presidida
pelo Marechal José Pessoa, em 1955, que os urbanistas Raul Pena Firme, Roberto
Lacombe José de Oliveira Reis, incluíram a criação de um lago ornamental.
Juscelino
Kubitschek é eleito presidente do Brasil em outubro de 1955. No seu plano de
metas, a construção da nova capital Brasília era meta-síntese. A escolha do
Sítio Castanho- local onde se localiza o DF- em abril de 1955, já contemplava a
proposta do Lago Paranoá. Em 15 de março de1957, o júri escolheu o projeto de
número 22 de autoria do arquiteto e urbanista Lúcio Costa. Brasília e o lago,
finalmente iriam sair do papel.
Sangue, suor e lágrimas
|
JK me frente ao Palácio da Alvorada - Divulgação |
Fácil
não foi. Diria Juscelino em seu livro Por que construí Brasília. Os problemas
na construção da barragem do Paranoá foram “os de solução mais difícil”. JK precisou
intervir, pois a empresa contratada para a obra da barragem e da usina do Rio
Paranoá, a norte-americana Raymond Concrete Pile, não concluiu o serviço e teve
que ser substituída por um pool de seis empresas brasileiras.
|
Construção da Barragem do Paranoá. Dezembro/1959 - Foto: Mário Fontenele |
Enquanto
para os operários das obras do Plano Piloto, a rotina era por demais exaustiva,
para os candangos que trabalhavam na barragem, ela exigia esforço físico
supremo, principalmente para os que tinham de quebrar as pedras usadas na
compactação da muralha que interceptou as águas do rio Paranoá e de seus
afluentes. Um trabalho hercúleo em nome do sonho da Nova Capital. Mas Brasília
não poderia ser inaugurada com um lago vazio, ele era a “moldura líquida da
cidade”, disse JK.
Pelo
menos meia dúzia de pedreiras foram exploradas nos arredores do lago para a
retirada de cascalho, brita e areia necessárias à construção da barragem.
Algumas eram particulares, outras pertenciam às construtoras.
A “Atlântida” brasiliense
|
Vila Amaury- 1958/1959 - Divulgação |
O
Lago Paranoá guarda segredos e tesouros. Olhando o espelho d’água de 38
quilômetros quadrados não se pode imaginar o que tem no fundo. Muito desse
mistério tem origem em uma vila improvisada, construída por os operários que
trabalhavam na obra do Congresso Nacional e dos Ministérios.
Inicialmente
conhecida por “Sacolândia”, depois por “Vila Bananal” (nome da fazenda que deu
origem à maior parte do DF) e, finalmente por Vila Amaury (nome de um
funcionário da Novacap e um dos líderes da epopeia), a vila chegou a abrigar 16
mil pessoas, que conheciam o destino do local: a submersão, quando o lago
chegasse.
Apesar
de provisório o lugarejo tinha ruas, bares, comércio e até um pequeno parque de
diversões, que alegrava os domingos empoeirados daqueles bravos moradores. Durante
oito meses as águas avançavam mansas, lentamente, por sobre a terra seca e
avermelhada do cerrado. Até que a água atingiu o joelho das pessoas e foi
preciso uma grande operação da Novacap para retirar todo mundo às pressas. Por
isso, muitas casas e pertences permanecem intactos até hoje no fundo do lago
|
Mergulhador no Lago Paranoá, dentro de uma kombi. Foto: Agência Estado |
As
primeiras famílias transferidas da Vila Amaury e de invasões próximas a Vila
Planalto foram assentadas em Sobradinho. Outras famílias foram encaminhadas
para a cidade do Gama e Taguatinga.
A “Atlântida”
brasiliense existiu onde atualmente fica o Grupamento dos Fuzileiros Navais e o
Iate Clube. Por conta dessa magia, o local é explorado por mergulhadores
interessados em desvendar os segredos dos primórdios da capital.
Curiosidades
Paranoá
que é um vocábulo de origem tupi. Significa "enseada de mar", através
da junção dos termos paranã "mar" e kûá "enseada", foi em
sua origem
um
rio piscoso e pedregoso, que dividia os municípios de Planaltina e Luziânia e
era bordeado em vários pontos por uma mata alta e densa.
|
Vista panorâmica do Lago Paranoá - Divulgação |
Na
barragem foram utilizados 684 mil metros cúbicos de pedra e a mão de obra entre
1,2 mil e 3 mil operários (não há registros históricos definitivos). Com o
represamento do Rio Paranoá, originou-se a usina que supria o Distrito Federal,
mas que, atualmente, representa apenas 2,5 por cento de seu consumo energético.
Quando
o Lago Paranoá atingiu a cota 1000 (mil metros acima do nível do mar), suas
águas se estendiam por 37,5km².
Fauna
|
Biguá, na beira do Lago Paranoá - Divulgação |
Uma
das aves mais comuns do lago é o biguá. São também encontrados garças,
águias-pescadoras, matracas, marrecas-pé-vermelho e marrecas-irerê. Entre
mamíferos há a presença de lontras, capivaras, cuícas-d'água, ratos-d’água,
micos-estrela, gambás-de-orelha-branca e ratos-do-campo.
Há
também o jacaretinga, uma espécie nativa do lago que prefere as águas mais
rasas e com mais vegetação e que não costuma atacar humanos.
Ilha
do Retiro
|
Ilha do Retiro- Lago Norte - Divulgação |
Desde
o ano 2000, a pesca é permitida e incentivada no lago após sua despoluição,
onde são extraídos em sua maioria tilápias, espécie não nativa, assim como o
tucunaré e a carpa, esta última introduzida especialmente como limpeza contra
as algas. As espécies nativas são cará, lambari e traíra.
Navegação
e Esportes Náuticos
|
Barragem do Paranoá - Divulgação |
O
Distrito Federal possui mais de 11 000 embarcações registradas, sendo a
terceira maior frota náutica do país. Entretanto, não há, em toda a orla do
lago, qualquer píer ou marina públicos.
São
praticados no lago vários esportes náuticos como canoagem, remo, iatismo, esqui
aquático e até mergulho. Ali é realizada, desde 1994, a Regata JK, disputa com
mais de duzentas embarcações
Naufrágio
|
Imagination - maior naufrágio do Lago Paranoá - Foto: Divulgação |
No
dia 22 de maio de 2011, um barco Superlotado, que apresentava problemas estruturais e não tinha colete salva-vidas para todos os passageiros, naufragou no
Lago Paranoá. O acidente aconteceu por volta das vinte horas e trinta minutos,
durante um evento que estava sendo realizado. A embarcação tinha licença para
operar com noventa passageiros e dois tripulantes, mas o Corpo de Bombeiros diz
que pelo menos 104 pessoas estavam a bordo. Porém não se tem certeza da
quantidade exata no número de pessoas presentes no barco. A
embarcação ficou inclinada e a 17 metros de profundidade. Foi confirmado que
nove pessoas perderam a vida na tragédia.
Projeto
Na Praia
|
Na Praia - Divulgação |
A
partir de 2015 o projeto Na Praia criou uma praia artificial às margens do Lago
Paranoá. A área coberta pela areia da praia é de 6mil m², com o total de 400mil
toneladas. O evento foi pensado de forma a reduzir impactos ambientais, sendo
hoje modelo de evento sustentável.
Datas
18
de outubro de 1956 — Israel Pinheiro informa à imprensa que as obras de
represamento do Lago Paranoá já começaram.
Julho
de 1957 — Concluído o anteprojeto da usina hidrelétrica.
Dezembro
de 1958 — Início das obras da ensecadeira do desvio, com previsão de que, no
começo de 1959, se completaria o canal do desvio. Em seguida, ficariam prontas
a ensecadeira do desvio, a escavação do vertedouro e a impermeabilização.
Janeiro
de 1959 — Conclusão da ensecaderia do desvio e conclusão do vertedouro.
28
de fevereiro de 1959 — O canal para o desvio, a ensecadeira do desvio, a
escavação do vertedouro e a segunda fase da impermeabilização foram concluídos.
25
de abril de 1959 — A Novacap anuncia que, por determinação do ministro da
Marinha, almirante Mattoso Maia, o Arsenal da Marinha no Rio de Janeiro iria
construir as comportas da barragem do Rio Paranoá.
2 de
maio de 1959 — Em avião especial, chega a Brasília 1,5 mil exemplares de peixes
selecionados pela Divisão de Caça e Pesca do Ministério da Agricultura e que
servirão de reprodutores no Paranoá.
12
de setembro de 1959 — Fecha-se a barragem do Paranoá. Juscelino e Sarah fazem
descer a comporta de ferro da barragem, manobrando um trator, sob o testemunho
de uma multidão. O lago começa, então, a se formar.
19
de novembro de 1959 — A Usina do Paranoá, contratada com a Siemens, aproveitará
o desnível da Cachoeira do Paranoá e a barragem do Lago. Os trabalhos da
barragem já estão concluídos na parte essencial, ficando a Siemens com os
serviços de instalação da usina.
O Futuro
|
Subsistema Lago Norte - Foto Caesb |
Com
74% das obras concluídas, o início da captação de água do Lago Paranoá está
previsto para 2 de outubro deste ano. De acordo com a Caesb, a obra foi
contratada para execução no prazo de oito meses. A previsão é que o subsistema
inicie a captação de 700 litros por segundo.
A estrutura está na ML 4, no Setor de Mansões do Lago Norte.
Quando
finalizada, a obra será usada pela Caesb para abastecer
Asa Norte, Itapoã, Lago Norte, Paranoá, Parte
de Sobradinho II e Taquari, aliviando o Sistema Produtor Santa Maria-Torto, que
poderá transferir sua produção para outros reservatórios e ajudar a
minimizar a crise hídrica no DF.
|
Pedalinhos - Jornal de Brasília |
O
Lago Paranoá é um patrimônio natural da capital Patrimônio da Humanidade. Espelho
do céu exuberante de Brasília e orgulho da sua população. Uma saudação especial
a Glaziou, Juscelino, Lúcio, Oscar, Sayão, Israel, Ernesto e tantos outros.
|
Lago Paranoá ao entardecer - Divulgação |
Fontes
de consulta:
FONSECA,
Fernando Oliveira. Org. Olhares sobre o Lago Paranoá. Brasília: Secretaria de
Meio Ambiente e recursos Hídricos, 2001.
CRULS,
Luiz. Relatório da Comissão Exploradora do Planalto Central: relatório Cruls.
Brasília: CODEPLAN, 1992.
Relatório
Técnico sobre a Nova Capital da República: relatório Belcher. 3 ed. Brasília:
CODEPLAN, 1984.
COSTA,
Lúcio. Relatório do Plano Piloto de Brasília: Brasília Cidade que Inventei.
ArPDF, CODEPLAN, DePHA. Brasília: GDF, 1991.
KUBITSCHEK,
Juscelino. Por que construí Brasília. Brasília:Senado Federal, 2009
Instituto
Histórico e Geográfico do DF - IHG
Correio
Braziliense
Jornal
de Brasília